Em 10 de outubro, como previsto no “calendário do futuro” do Embaixador
Macedo Soares, foi comemorado o 75º aniversário da fundação do Partido dos
Trabalhadores Norte-coreanos, atualmente no poder. As celebrações
ocorreram em Piongiang, quando todos os olhares estavam concentrados no
líder do país, Kim Jong-sun, em virtude dos boatos de problemas cardíacos
que estaria sofrendo.
Para afastar os boatos, o destaque foi a parada militar, na qual foram
apresentados os novos mísseis balísticos de longo alcance, demonstrando a
prioridade de governo de Kim Jong-sun para a defesa e concretizando sua
estratégia de dissuasão.
Alguns dias depois, a Coréia do Norte foi tema do terceiro e último debate entre
os candidatos à presidência dos EUA, em que Biden questionou os duvidosos
resultados da visita feita por Trump a Kim Jong-sun, visando a aproximação
entre as duas Coreias, depois do declarado apoio da China à Coreia do Norte.
Ainda neste mês de outubro, em cerimônia no dia 23, o presidente chinês Xi Ji
Ping recordou o 70º aniversário da Guerra da Coreia (1950 a 1953), em que
morreram cerca de duzentos mil soldados enviados por Pequim para lutarem
em apoio à Coreia do Norte contra a do Sul, esta, à época (e até hoje), tendo
os norte-americanos como aliados.
A China trazer a Guerra da Coreia à lembrança, neste momento, tinha um
endereçado certo de comunicação.
Mas, antes de continuarmos, cabe uma breve recordação de que a Guerra da
Coreia não foi apenas um conflito armado decorrente do contexto da Guerra
Fria, entre EUA e União Soviética.
Antecedendo este conflito, a península Coreana fora invadida pelo Japão
durante a II Guerra Mundial, mas, em 1945, após a derrota do Japão, que
retirou suas tropas de ocupação, a Coreia foi fracionada, tendo o paralelo de
38º Norte como limite geográfico para atuação entre soviéticos e norte-
americanos, ocorrendo divisão real, com o surgimento de dois Estados
coreanos, tutelados por cada uma das duas potências da época.
A Guerra da Coreia teve início formal em 25/6/1950, quando os coreanos do
norte lançaram um ataque ao sul, alegando violação do paralelo geográfico de
38º Norte.
Foi quando, em reação, o Conselho de Segurança da ONU, autorizou os
Estados Unidos e seus aliados a enviarem tropas para a região, sob o
comando do general MacArthur, que exigiu que lhe fossem conferidos plenos
poderes, inclusive para fazer uso de armas nucleares.
O medo de um conflito nuclear se confirmou quando os Estados Unidos
ameaçaram atacar a Coreia do Norte e a China, caso o Norte não se rendesse.
Curioso que, tecnicamente, o conflito ainda não acabou, pois não foi assinado
nenhum tratado de paz, apenas um armistício em 27 de julho de 1953,
restabelecendo as fronteiras, vigiada por militares, sobre o paralelo 38° Norte.
Deste modo, as fronteiras voltaram ao determinado durante a Segunda Guerra
e as duas Coreias seguem divididas, tanto territorial quanto ideologicamente: a
Coreia do Norte se manteve comunista e a do Sul capitalista.
Em 1987, os dois países resolveram iniciar conversas para uma possível
aproximação, após décadas de ataques e atentados terroristas como a
explosão do avião da Korean Air.
A Coréia do Norte foi governada por Kim II-sung, que permaneceu no poder até
sua morte em 1994, quando foi sucedido pelo filho Kim Jong–il. Este nomeou
seu filho Kim Jong-sun para presidente, em dezembro de 2011, que é o atual
mandatário do país.
A Coreia do Sul, por sua vez, saiu da condição de país agrário para a de “tigre
asiático”. Recebeu investimentos e tecnologia estrangeira, ascendendo à
posição de uma das nações mais desenvolvidas do mundo.
Em mais uma busca pela paz entre as Coreias, ocorreu a visita do presidente
sul-coreano Moon Jae-in ao seu par norte-coreano, Kim Jong-un, em abril de
2018, sem aparente continuidade.
Portanto, a China recordar, neste mês de outubro, a Guerra da Coreia
formalmente, no Palácio do Povo em Pequim, tinha endereço: resposta ao
anúncio dos EUA, um dia antes, em 22/10, de venda de 135 mísseis de longo
alcance a Taiwan. No pronunciamento de Xi Ji Ping ficou clara a advertência, a
“qualquer invasor potencial”, que a China não ficará de braços cruzados
sempre que estiver ameaçada, invadida ou sofrer tentativa de divisão, o que
inclui a ilha de Taiwan.
Para os observadores internacionais, estes três eventos ocorridos em outubro
nos mostram que há muitos ecos da Guerra da Coreia nos dias de hoje.
Jose Alberto Cunha Couto é oficial reformado da Marinha, tendo sido um dos 8 Comandantes na história da MB, que realizaram viagem de circunavegação. Criou e chefiou o Gabinete de Crises de Presidência da República por 12 anos. Foi professor e diretor de Centro de Estudos e Pesquisas e Relações Internacionais da Facamp, e por 6 anos foi responsável pelo planejamento estratégico da empresa Amazul, estatal para projetos de tecnologia nuclear.