Submarino nuclear afunda antes de se tornar realidade

por | jan 18, 2024 | 12h

Marcelo Rech

No que depender dos países nucleares, a construção do submarino nuclear brasileiro, obsessão antiga das Forças Armadas, será afundado antes mesmo de sair do papel. De acordo com o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o argentino Rafael Grossi, “o Brasil só terá aval da ONU para operar um submarino de propulsão nuclear se abandonar as posições históricas de resistência a inspeções detalhadas de suas instalações atômicas”.

O Brasil chegou a gastar R$ 130 milhões anuais no projeto de construção do submarino nuclear, desenvolvido em parceria com a França. O Programa Nuclear da Marinha teve início em 1979 e a obtenção do submarino de propulsão nuclear (sem armamento atômico), é o seu principal objetivo. Desde então, cerca de R$ 30 bilhões foram destinados apenas ao submarino nuclear.

Já se vão 40 anos desde o início do programa e o submarino nuclear seria, em tese, entregue à Marinha, em 2029. Na prática, Grossi, eleito e reeleito para o cargo com o voto brasileiro, faz o jogo das grandes potências. Nem mesmo a França, com que o Brasil tem uma parceria antiga no desenvolvimento de submarinos, vê com bons olhos tal ambição.

Os EUA, por exemplo, já fizeram de tudo para o Brasil desistir do programa. Em setembro de 2023, o ex-presidente da França, Nicolás Sarkozy, revelou que a interferência de Washington para evitar que o Brasil adquirisse turbinas Arabelle da Alstom, consideradas as melhores do mundo e que poderiam ser utilizadas tanto em usinas como no próprio submarino.

Ele explicou, ainda, que foi pressionado pelos EUA para não fechar a parceria que criou o Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB). “Os americanos não aceitam bem a menor recusa de alinhamento sistemático, que é imediatamente percebida como uma traição. São os americanos, e somente eles, que fazem a chuva e o bom tempo”, afirmou.

Em 2019, o Wikileaks já havia revelado que os EUA estavam impedindo que o Brasil conquistasse qualquer avanço tecnológico nos campos espacial e nuclear. A estratégia de Washington contava, segundo telegramas do Departamento de Estado, com a anuência do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Os EUA também pressionaram a Ucrânia para que a parceria com o Brasil, na área espacial, fosse emperrada.

Grossi destaca que o Brasil – no caso, a Marinha – nunca foi receptiva às inspeções por parte da AIEA e levanta dúvidas no caso do combustível físsil para o futuro submarino. Embora seja parte do Tratado sobre a Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), o Brasil não aderiu aos Protocolos Adicionais de 1997.

Diante deste cenário, a tendência é que o programa continue se arrastando. O atual governo deve cortar ou contingenciar recursos e, só isso, já é suficiente para estourar os cronogramas e inviabilizar a empreitada. A desconfiança mútua entre o presidente e os militares é outro elemento que coloca a concretização do programa mais distante.